Humaira Bachal sabe como ninguém como a falta de uma boa educação prejudica a sua comunidade. Ela tinha um primo que morreu porque sua mãe não podia ler a data de validade em um frasco de remédio. Ela conhece histórias de mulheres do seu bairro que morreram ao dar à luz em casa porque suas famílias não sabiam para enviá-las para o hospital.
"Estas histórias partem o meu coração e toda vez que eu me pergunto: ‘Por que as pessoas estão fazendo isso?’", diz Humaira, de 26 anos. "Acho que quando o meu povo for bem educado estes problemas vão diminuir."
Aos 13 anos ela começou a ensinar outras meninas o que ela aprendeu na escola. Essas aulas em casa entre amigas se transformou no grande trabalho de sua vida - trazendo educação para crianças em Muwach Goth, bairro de classe operária situado na periferia de Karachi, cidade portuária do Paquistão. Lá, muitos pais não colocam as filhas na escola e até mesmo os meninos lutam para conseguir um aprendizado decente.
Humaira dirige uma fundação que ensina cerca de 1.200 meninos e meninas de sua comunidade. É a dona de uma história sobre como é possível mudar não só o seu próprio futuro, mas o das pessoas ao seu redor.
Com a ajuda de doações nacionais e internacionais – até a cantora Madonna deu dinheiro - a fundação está construindo uma nova casa de 18 quartos para abrigar a escola, que já conta com 33 professores.
Estudou escondida do pai
Como acontece em muitas comunidades pobres do Paquistão, a família de Humaira não queria educar a menina. Ela terminou a escola primária, mas seu pai a proibiu de continuar porque queria que ela se casasse. Com a ajuda da mãe, Humaira seguiu estudando em segredo. Ela escondia o uniforme escolar e os livros na casa de um amigo. Isso durou nove meses, até que um dia o pai dela descobriu.
Ela estava se preparando para ir para a escola para faz uma prova, mas seu pai chegou em casa mais cedo e questionou onde estava indo. Quando ele descobriu que ela tinha ido secretamente para a escola, ele ficou furioso e lhe deu um tapa no rosto. A mãe entrou na briga para defender a fila e mandou Humaira ir à escola.
O pai acabou cedendo, concordou que a filha terminasse os estudos, desde que ela se casasse com o homem que ele escolheu. Humaira acabou os estudos, fez faculdade, aprendeu inglês e está estudando para o mestrado. E ainda não se casou.
Sua dedicação atrai comparações com Malala Yousafzai, de 16 anos, a menina que se tornou símbolo do direito à educação para mulheres depois de sobreviver ao ser baleada na cabeça por um talibã em 2012. Humaira disse que ela não enfrentou qualquer tipo de violência, só a resistência dos mais velhos da comunidade.
Início
Humaira começou a dar aulas aos 13 anos, com a ajuda de sua irmã mais nova Tahira, em uma sala de aula improvisada em sua casa, ensinando cerca de 10 de suas amigas que não puderam ir à escola. Em dois anos ela já tinha 150 alunos. Ao mesmo tempo, ela pressionou as famílias no seu bairro para enviar seus filhos à escola, embora o pedido nem sempre foi bem recebido.
"A comunidade é composta de trabalhadores e pessoas que são trabalhadores não qualificados. Então ela teve de convencê-los que a educação é importante para as crianças", disse o cineasta paquistanês Sharmeen Obaid-Chinoy, vencedor do Oscar de melhor documentário em 2012, que fez um filme sobre a escola de Humaira. "Aqui as pessoas têm de 8 a 10 filhos, e eles querem que seus filhos trabalhem."
A fundação que Humaira dirige oferece programas de orientação, exames de saúde para estudantes e formação de professores.
A escola pública que fica próxima mostra o estado deplorável da educação no Paquistão. O prédio de dois andares parece abandonado, sem janelas ou móveis e sem portas no banheiro. Depois da aula, o professor enrola o tapete do piso de concreto e o esconde em uma fábrica em frente para ele não ser roubado.
Por outro lado, o novo edifício em construção para a escola de Humaira já tem um andar concluído. Os alunos têm cadeiras e mesas em salas de aula com paredes decoradas com material didático produzido por eles. Há banheiros separados para meninos e meninas.
Humaira tenta empregar técnicas modernas de ensino em vez da “decoreba” vista em muitas escolas do Paquistão. Meninos e meninas frequentam as aulas juntos, mesmo nas classes superiores, que muitas vezes são segregadas no país.
A jovem diz que ainda enfrenta muita resistência, mas não desiste do seu maior sonho: construir uma universidade.
Fonte: G1
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