domingo, 9 de março de 2014

Panelinha na igreja

O segundo livro de Reis relata a história de uns rapazinhos que zombavam de Eliseu logo após o relato da subida de Elias ao céu. É muito comum encontrar essa conexão entre os dois eventos para dizer que os tais rapazinhos zombavam de Eliseu dizendo “sobe calvo” considerando-o um profeta de segunda categoria, uma vez que ele não subiu ao céu com Elias. Será que é por aí mesmo? Vejamos o texto mais de perto.

“Então, subiu dali a Betel; e, indo ele pelo caminho, uns rapazinhos saíram da cidade, e zombavam dele, e diziam-lhe: Sobe, calvo! Sobe, calvo! Virando-se ele para trás, viu-os e os amaldiçoou em nome do SENHOR; então, duas ursas saíram do bosque e despedaçaram quarenta e dois deles.” 2Rs 2:23-24

Nossos amigos exegetas não precisavam juntar informações tão distantes. Observe como o autor inicia essa fase da narrativa: “então, subiu dali a Betel...” Eliseu estava em Jericó, veja o versículo 18: “Então, voltaram para ele (Eliseu), pois permanecera em Jericó...” Para ir de Jericó a Betel ele precisava subir de 250 metros abaixo do nível do mar até 880 metros acima do nível do mar.

Mesmo que os detalhes geográficos e topográficos da região fossem desconhecidos pelo leitor, seria mais simples apenas observar a própria narrativa: “subiu dali a Betel.” Outra indicação dessa realidade topográfica está em Lucas 10:30 – “Jesus prosseguiu, dizendo: Certo homemdescia de Jerusalém para Jericó...” Jerusalém e Betel são cidades vizinhas (Betel fica 20km ao norte de Jerusalém) que compartilham da mesma elevação de terreno acima de Jericó, que fica às margens do rio Jordão. Observe o mapa abaixo e compare a localização das cidades de Jerusalém, Betel ao norte e Jericó à direita de Betel margeando o rio Jordão.

Fonte da imagem: http://www.snpcultura.org/id_dicionario_das_escrituras.html


Nossos amigos ainda cometem um erro comum: eisegese. O trabalho da exegese é extrair do texto as informações para a interpretação; a eisegese colocar informações no texto para fazer a interpretação. Devemos evitar a eisegese porque ela invariavelmente conduz o leitor a uma interpretação forçada e tendenciosa.

Os mesmos intérpretes que ligam a zombaria com a subida de Elias ao céu adicionam um elemento estranho ao texto, algo que pertence apenas à imaginação: “Os rapazinhos provavelmente ouviram o relato da subida de Elias ao céu...” – Isso não passa de especulação!

Portanto, podemos aprender duas lições desse equivoco comum. 1) O contexto imediato fala mais alto que um contexto mais distante. As palavras e declarações dos personagens bíblicos não estão espalhadas aleatoriamente sem conexão alguma com a narrativa bíblica. É necessário analisar com cuidado todo o contexto. 2) Precisamos aprender a não mitificar os eventos bíblicos levando tudo para o lado espiritual, às vezes, a compreensão depende apenas de conhecimento sobre a cultura, ou geografia. Fique ligado! 
Autor: André R. Fonseca
www.andreRfonseca.com
Twitter: @andreRfonseca

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Fonte da imagem (urso): http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Bear_Square.JPG

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